sábado, 17 de abril de 2010

Os Brutos Também Amam



As Esporas de Jack Palance

A cena: de um lado lama, do outro a aridez do velho oeste. De um lado o pistoleiro contratado para matar, do outro o colono que tenta defender suas terras.
Na tentativa de ser superior à lama, o pistoleiro Wilson, magistralmente interpretado por Jack Palance, caminha sobre a fachada de um saloon aguardando enquanto Frank Torrey, o colono, hesitante, tenta atravessar o lamaçal.
Sua dificuldade em vencer as poças de lama revela naquele instante a incompatibilidade dos personagens, afinal aquele senhor, ex-combatente da guerra civil americana, que agora labuta em seu pedaço de terra nada teria de equivalência nem de inferioridade comparado ao jovem pistoleiro frio e calculista.
Contudo, como a lei que fala mais alto é a das armas e da violência, quem acaba por ficar em posição superior para o início de um duelo é o bandido que, do alto da fachada daquele saloon, desfere um disparo certeiro no peito do colono o qual, por sua vez, termina sua vida desabado sobre a lama.
O filme: Os Brutos Também Amam (Shane, 1953) de George Stevens.
Mas, afinal, onde entram as tais esporas?
Como cinema nem sempre é só imagem, outro recurso é manejado com perfeição para atribuir ainda mais tensão à cena descrita. O som.
Enquanto Jack Palance caminha minutos antes do início daquele arremedo de duelo escutamos o tilintar de suas esporas se sobrepor a todos os demais barulhos.
São passos lentos, calmos, mas que passam ao espectador todo tipo de possibilidade.
Assim, tem-se a infeliz superioridade do pistoleiro Wilson demonstrada numa inteligente fusão de imagem, som e, por fim, interpretação, afinal, o simples sorriso estampado no rosto de Palance é o bastante para sugerir todo o prazer de matar nutrido por seu personagem.
A conclusão: não obstante a excelência como um todo que um filme possa ter, por vezes uma única cena é capaz de mostrar o quão rica em símbolos e detalhes uma tomada cinematográfica pode ser, bem como o quanto, na condição de arte coletiva de técnicas e de profissionais, o cinema pode dar ao público experiências inesquecíveis.
Por isso, Os Brutos Também Amam ostenta um merecido status icônico, afinal, como esquecer as esporas de Palance? Ou como deixar de lembrar-se do cachorro que sai com o rabo entre as pernas toda vez que surge em sua frente o pistoleiro mal encarado? É difícil, muito difícil...

Dario Façanha Neto (texto originalmente publicado em http://setimacritica.blogspot.com/)

COTAÇÃO: *****


Ficha Técnica
Título Original: Shane
Direção: George Stevens
Elenco:Douglas Spencer (Axel 'Swede' Shipstead)John Dierkes (Morgan Ryker)Alan LaddBen (I) Johnson (Chris Calloway)Van Heflin (Joe Starrett)Chester W. Hannan (Ryker man)Emile Meyer (Rufus Ryker)Paul McVey (Sam Grafton)Martin Mason (Ed Howells)John (XX) Miller (Will Atkey, bartender)Clayton Moore (Ryker)Jack Palance (Walter Jack Palance)Helen Brown (Martha Lewis)Jean Arthur (Marian Starrett)Leonard Strong (Ernie Wright)Elisha Cook Jr. (Frank 'Stonewall' Torrey)Brandon De Wilde (Joey Starrett)Charles Quirk (Clerk)Nancy Kulp (Mrs. Howells)Edith Evanson (Mrs. Shipstead)Ellen Corby (Mrs. Liz Torrey)Janice Carroll (Susan Lewis)Beverly Washburn (Ruth Lewis))Edgar Buchanan (Fred Lewis) (Shane)


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