terça-feira, 4 de maio de 2010

Gritos e Sussurros

gritos-e-sussurros Ambientação da primeira cena do filme: a neblina, o jardim, a casa, os relógios (vários deles) a irmã que dorme na sala ao lado e a irmã enferma. E assim tem início mais uma obra de arte do genial diretor sueco Ingmar Bergman com a belíssima fotografia de Sven Nykvist. Nessa película de 1972 Bergman abusa da cor vermelha e dos closes para nos mostrar a fria relação entre três irmãs, Karin (Ingrid Thulin), Maria (Liv Ullmann) e Agnes (Harriet Andersson), esta última, sofre, devido ao câncer terminal e tem como criada Anna (Kari Sylwan), a qual cuida da enferma com notável zelo e carinho.

Os relógios são os carrascos de Agnes, dando a ela cada vez menos tempo de vida e a nós mais tempo de closes torturantes. Não que haja algum problema em encarar as interpretações magistrais que Bergman sempre conseguia extrair de suas atrizes, mas é como se invadíssemos a intimidade das irmãs. As cenas esvaem-se em fade outs de um vermelho vibrante, vermelho esse que inicia a próxima cena, que entra em fade in. O mesmo vermelho que dá vida a casa, predominante em todos os ambientes e contrasta com as vestes em cores claras e por vezes mórbidas, preferidas pelas personagens.

gritos_e_sussurros_anna_maria_agnes_karin E como falar de Bergman sem falar nas questões existenciais presentes em todos os seus filmes e sempre muito bem abordadas? Enquanto joga xadrez com a personificação da morte de maneira a prolongar sua própria existência, Antonius Block (Max von Sydow) refletia sobre sua própria vida, em mais um brilhante filme de Bergman (O Sétimo Selo). Ao se deparar com a agonia dos últimos dias de Agnes, Karin e Maria também refletem sobre suas próprias vidas, seus matrimônios, suas inseguranças e infelicidades. E a morte de Agnes acaba aproximando as vidas separadas de suas irmãs.

É importante ressaltar ainda a bela relação entre Agnes e Anna, a carinhosa e incansável Anna, que por tantas desventuras passou na vida, sempre tão presente, mesmo quando não requisitada, e cheia de zelo por Agnes. Mas quando se trata de Begman é difícil não ser injusta com uma obra tão cheia de aspectos que podem ficar na casa do não dito. Dono de uma mise em scène ímpar, Bergman sabia muito bem como utilizar cada elemento cinematográfico para expressar exatamente o que ele nos queria transmitir em suas obras. O silêncio é tão presente, tão fundamental e tão bem utilizado na obra, que parece até um personagem, sempre entrecortado por gritos de dor e sussurros renitentes.

Salma Nogueira.

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