sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Tropa de Elite 1 e 2

Yes, Nós Temos Blockbuster!
                      
Eis que o Capitão Nascimento – agora promovido a tenente-coronel – voltou! Numa inevitável comparação com o filme antecessor, Tropa de Elite 2 (Brasil, 2010) revela um trabalho ainda mais coeso e maduro do diretor José Padilha, pois enquanto o primeiro volume mostrava um impecável rigor técnico, suas críticas sociais e contra a corrupção policial cutucavam de forma por vezes pouco incisiva as feridas do sistema dada a preferência pela concentração da trama em torno dos dilemas pessoais dos personagens, o que, vale lembrar, nem sempre surtia o resultado esperado em virtude das interpretações vacilantes de determinados membros do elenco.
A seqüência do sucesso de 2007, em contrapartida, não deixa de abordar dramas particulares - que, desta vez, se limitam a pessoa do anti-herói Nascimento – mas também logra êxito em ter seu horizonte expandido por conta do roteiro redondinho de Bráulio Mantovani. Dentro deste contexto, as mazelas tupiniquins são novamente expostas, porém, nesta oportunidade são diretamente relacionadas a conchavos entre a polícia e os poderes executivo e legislativo, numa teoria que de conspiratória, infelizmente, nada tem.
É curioso como enquanto o primeiro filme que não era para ter como estrela principal o Capitão Nascimento acabou sendo montado dessa maneira em razão da avassaladora atuação de Wagner Moura, ao passo que Tropa de Elite 2, apesar de amplamente divulgado como a produção oficialmente protagonizada por aquele personagem, acaba abrindo mão de razoável tempo em tela do mesmo para tornar a trama, assim, ainda mais intricada graças aos deliciosos e funcionais personagens coadjuvantes.
 José Padilha demonstra, desta feita, um louvável compromisso com a história a ser contada, não se rendendo, portanto, a caminhos que poderiam ser bem mais simples e seguros, considerando a aceitação pública perante o trabalho anterior e principalmente para com o papel defendido por Wagner Moura. Isto posto, o cineasta em conjunto com o roteirista supracitado e com sua brilhante equipe técnica – praticamente a mesma da obra antecessora – optam por não fazer mais do mesmo e sim por aparar arestas pretéritas, bem como por preencher com doses maiores de conteúdo e densidade a análise crítica materializada em experiência cinematográfica.
                              Sim, Wagner Moura continua um monstro na pele do policial que marcará para sempre sua carreira. Sim, o recurso da narração permanece sendo utilizado com eficiência e sem, por conseguinte, retratar o óbvio. Sim, as cenas de ação são novamente ótimas. Sim, desta vez o elenco como um todo rende o esperado. Sim, a ferida agora é escancarada sem qualquer vestígio de piedade, motivo pelo qual a crítica sócio-político-econômica é muito mais dura. Sim, a música tema da vez – O Calibre dos Paralamas do Sucesso – além do necessário impacto sonoro, encaixa-se com exatidão muito maior a temática do longa-metragem.
                           Por isso tudo, tal qual conclui o Coronel Nascimento acerca do sistema, Tropa de Elite 2 é foda.
 
Dario Façanha (texto originalmente publicado em http://www.setimacritica.blogspot.com)
 
COTAÇÕES: 
Tropa de Elite - ☼☼☼☼              

Tropa de Elite 2 - ☼☼☼☼☼ 


Ficha Técnica - Tropa de Elite

Direção: José Padilha
Roteiro: Bráulio Mantovani, José Padilha, Rodrigo Pimentel
Produção: Marcos Prado, José Padilha
Estúdio: Zazen Produções
Elenco: André Felipe (André Mauro)André Ramiro (André Matias)Wagner Moura (Capitão Nascimento)Fábio Lago (Claudio Mendes de Lima 'Baiano')Patrick Santos (Tinho)Luiz Gonzaga de Almeida, Maria Ribeiro (Rosane)Caio Junqueira (Neto)Milhem Cortaz (Capitão Fábio)Marcelo Valle (Capitão Oliveira)Paulo Vilela (Edu)Cintia Rosa (Helen)Fernanda de Freitas (Roberta)Bruno Delia (Capitão Azevedo)Otto Jr. (Major Gouveia) Thiago Mendonça, Alexandre Mofatti (Sub-Comandante Carvalho)Erick Oliveira (Marcinho)Marcelo Escorel (Coronel Otávio)Emerson Gomes (Xaveco)Paulo Hamilton (Soldado Paulo)André Santinho (Tenente Renan)Thogun (Cabo Tião)Ricardo Sodré (Cabo Bocão)Fernanda Machado (Maria)Thelmo Fernandes (Sargento Alves)
Música: Pedro Bromfman
Fotografia: Lula Carvalho
Figurino: Cláudia Kopke
Edição: Daniel Rezende
Estreia Mundial: 2007
Duração: 118 minutos


Ficha técnica - Tropa de Elite 2

Direção: José Padilha
Roteiro: Bráulio Mantovani, baseado em argumento de José Padilha, Rodrigo Pimentel e Bráulio Mantovani
Produção: Marcos Prado
Estúdio: Zazen Produções
Elenco: Tainá Müller, Rod Carvalho (Capitão Barcellos)Milhem Cortaz (Capitão Fábio)Seu Jorge (Beirada)Maria Ribeiro (Rosane)Wagner Moura (Coronel Nascimento)André Ramiro (André Matias), Pedro Van Held
Música: Pedro Bromfman
Fotografia: Lula Carvalho
Direção de arte:Tiago Marques
Figurino: Cláudia Kopke
Edição: Daniel Rezende
Estreia no Brasil: 8 de Outubro de 2010
Duração: 116 min

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Tudo Pode Dar Certo

Repetitivo? Jamais!

Cineastas com muitos anos de carreira tendem a naturalmente transitar entre gêneros e estilos como numa espécie de exercício de variação da assinatura pessoal. Pedro Almodóvar, por exemplo, abandonou há tempos o escracho com o qual caracterizara trabalhos como Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos (Mujeres al Borde de un Ataque de Nervios, 1988) e Ata-me! (Espanha, 1989) para concentrar-se em dramas pesados como Carne Trêmula (Espanha, 1997) e Má Educação (La Mala Educación, 2004). De igual modo, Woody Allen em determinado momento já freou o ritmo de suas comédias falastronas para, principalmente nos anos 80, dedicar-se a filmes voltados a uma estética, digamos, “bergmaniana”.
A experiência em ambos os segmentos permitiu a Allen, neste sentido, alternar sua filmografia desta última década entre dramas - por vezes inclinados ao suspense - e comédias despretensiosas. Assim, para cada Melinda e Melinda (EUA, 2004), Match Point (Inglaterra, 2005) ou O Sonho de Cassandra (Cassandra's Dream, 2007) o diretor intercalava um Dirigindo no Escuro (Hollywood Ending, 2002), Scoop – O Grande Furo (EUA, 2006) ou Vicky Cristina Barcelona (EUA, 2008).
Ora acertando em cheio ora exagerando um pouco na dose, Allen tornou inconteste, a quem ainda pudesse duvidar, o domínio gozado sobre o ofício que pratica, dada sua capacidade de permanecer fiel aos formatos por ele construídos sem, contudo, soar repetitivo.
Tudo Pode Dar Certo (EUA, 2009) confirma, dentro deste contexto, a habilidade de Allen em criar novas sacadas e piadas sobre assuntos por ele já tão debatidos, o que lhe confere a invejável capacidade de se manter atual ainda que seu modus operandi seja o mesmo de tempos atrás.
Inteligente e perspicaz como é, Woody Allen reconhece que o público já está deveras acostumado a fundir sua imagem com a dos protagonistas que interpreta, razão pela qual opta por novamente ficar apenas atrás das câmeras, escalando, por conseguinte, para a função de seu alter ego o ator Larry David que, não obstante a missão de servir como elemento visual novo da filmografia de Allen acaba, de modo semelhante, refletindo, através do neurótico personagem Boris, a imagem do cineasta.
Tudo Pode Dar Certo demonstra, portanto, que Allen não necessita de qualquer inovação em seu formato fílmico, eis que suas idéias, seus roteiros são, via de regra, saborosos pelo modo irônico com o qual aborda as neuroses do ser humano, ou seja, independentemente da forma adotada, o elemento do cinema de Allen que mais recebe atenção e que, por isso, mais se destaca é o conteúdo.
Neste diapasão, Tudo Pode Dar Certo é o tipo de produção leve, divertida, mas com muito a dizer, o que, no mínimo, mantém acesa a chama do cinema de autor. Por isso tudo, vida longa e próspera a Woody Allen.
 
Dario Façanha (texto originalmente publicado em http://www.setimacritica.blogspot.com)
 
COTAÇÃO -  ۞۞۞۞

Ficha Técnica
Título Original: Whatever Works
Direção e Roteiro: Woody Allen
Elenco: Evan Rachel Wood (Melodie)Carolyn McCormick (Jessica)Henry Cavill (Randy James)Olek Krupa (Morgenstern)Ed Begley Jr. (John)Michael McKean (Joe)Patricia Clarkson (Marietta), Larry David (Boris Yellnikoff)Patricia Clarkson (Marietta)John Gallagher Jr. (Perry) Carolyn McCormick (Jessica)Christopher Evan Welch (Howard)Jessica Hecht (Helena) Lyle Kanouse (Amigo de Boris)Adam Brooks (Amigo de Boris)
Estreia no Brasil: 30 de Abril de 2010
Duração: 92 minutos

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Frenesi

A trama de Frenesi é simples: um estrangulador de mulheres está solto em Londres. A polícia começa a investigar o caso e, pra variar, o principal suspeito do assassinato é assim considerado por estar no lugar errado, na hora errada. Richard (John Finch) precisa lutar para provar a inocência e acaba se envolvendo mais do que deveria no caso. O roteiro não é nada original. É até estranho imaginar que um diretor que já fez Um Corpo Que Cai e Psicose possa ter se dedicado a uma trama nada inovadora.

O que é mais curioso no filme, é que Frenesi foi a penúltima produção de Hitchcock e o filme que marcou a volta do diretor à Inglaterra. Porém, ao contrário do que poderia ser esperado, Frenesi não une as melhores características do diretor, apesar de apresentar muitas delas. Hitchcock continua utilizando os grandes planos-sequência, assim como em Festim Diabólico e usa e abusa das reviravoltas - o que nos dá alguma esperança de que o roteiro vai melhorar. Não há também aqueles personagens tão fortes, complexos e marcantes como Norman Bates de Psicose.


Frenesi não é o pior filme do mestre do suspense, mas também não está perto dos melhores. Os pontos positivos de Frenesi é a maneira quase única com que Hitchcock faz que o espectador se sinta participante da trama; algumas vezes ele deixa de mostrar algumas cenas, para que a platéia tenha a impressão de estar vendo tudo ao vivo. Ele sabe dosar o que vai mostrar na tela.

Frenesi é o tipo de filme que poderia ter alguns minutos a menos que tudo ficaria bem. Não faria falta no entendimento da história. Até porque os momentos mais gloriosos são os de assassinato, fora isso, resta ao espectador esperar mais momentos de suspense.

Talvez para alguém que esteja assistindo pela primeira vez um filme de Hitchcock, Frenesi não pareça assim tão inferior. Mas depois de ver Um Corpo Que Cai, Intriga Internacional, Festim Diabólico etc. Frenesi adquire o tom de mais um filme policial.

Ficha Técnica:

Frenesi (Frenzy)
Inglaterra - 1972
Direção: Alfred Hitchcock
Produção: Alfred Hitchcock
Roteiro: Anthony Shaffer
Trilha Sonora: Ron Goodwin
Elenco: John Finch, Alec McCowen, Barry Foster, Billie Withelaw, Ann Massey, Barbara Leigh-Hunt, Bernanrd Cribbins, Vivien Merchant, Michael Bates, Jean Marsh, Clive Swift, John Boxer, Madge Ryan, Elsie Randolph
Duração: 116 minutos

sábado, 16 de outubro de 2010

Comer, Rezar, Amar

Conclusões Equivocadas

Comer, Rezar, Amar (EUA, 2010) um filme baseado no best-seller homônimo de Elizabeth Gilbert, dirigido por Ryan Murphy – criador das tele séries Glee e Nip/Tuck – e estrelado pelos vencedores do Oscar Julia Roberts e Javier Barden. Certeza de um programa promissor? Eis que não.
Inicialmente cabe, desde logo, esclarecer que não é por ser um campeão de vendas que o material literário, no qual se baseia o roteiro, pode ser encarado como sinônimo de qualidade. Dito isso, a direção de Ryan Murphy pouco faz para melhorar o drama e retirar-lhe do lugar comum, uma vez que o cineasta mais parece inebriado pelas cenas paradisíacas nas quais se apóia, bem como nas tomadas gastronômicas que em muito se parecem com o estilo adotado em programas do gênero Companhia de Viagem.
Quanto ao elenco, Julia Roberts não convence em momento algum enquanto mulher em busca de autoconhecimento, eis que - tal qual Tom Cruise, por exemplo – o status de celebridade da atriz se tornou inflado ao ponto de sua imagem não mais desaparecer sob o papel interpretado. Já Javier Barden pode até bancar o latino para as bandas de lá, mas a nós brasileiros o ator não engana por conta do sotaque carregado demonstrado nas ligeiras frases em português proferidas.
Uma vez comprometidos os trabalhos dos atores principais, o brilho fica para os coadjuvantes, graças ao sempre eficiente Richard Jenkins e a James Franco que, após Milk (EUA, 2008) engatilha pela segunda vez consecutiva uma atuação sensível e precisa.
Não obstante a limitação da direção no que atine a condução da trama e do elenco, talvez o que mais incomode em Comer, Rezar, Amar seja o fato de ser um filme excessivamente longo calcado em torno de uma conclusão pífia, qual seja: o sucesso profissional e a independência financeira jamais serão suficientes para a mulher sem a presença de um macho dominante ao seu lado – o que em muito lembra as teses levantadas pelo quarteto de Sex and the City em sua franquia fílmica.
Desta feita, a egotrip da protagonista, após devidamente empanturrada de comida, tem o propósito final de encontrar o amor, numa demonstração de que para as indústrias literária e cinematográfica uma mulher, ao contrário do que bradam os movimentos feministas, dificilmente consegue se contentar com si mesma.
Por último, vale a menção acerca da interessante trilha sonora que só não é melhor por conta da estereotipada seleção de canções brasileiras. Neste sentido, pensar que a música pátria se resume à bossa nova acaba no fim sendo um pecado menor perante tantas outras conclusões equivocadas do longa-metragem.
Dario Façanha (texto originalmente publicado em http://www.setimacritica.blogspot.com)

COTAÇÃO: **

Ficha Técnica
Título Original: Eat Pray Love
Direção: Ryan Murphy
Produção:Dede Gardner
Elenco: Viola Davis (Delia)Silvano Rossi (Paolo)Luca Argentero (Giovanni)Tuva Novotny (Sofi))Welker White (Andrea Sherwood) Julia Roberts (Elizabeth Gilbert) Gita Reddy (The Guru) Giuseppe Gandini (Luca Spaghetti) A. Jay Radcliff (Andre)Hadi Subiyanto (Ketut Liyer)I. Gusti Ayu Puspawati (Nyomo)James Franco (David)Mike O'Malley (Andy Shiraz)Javier Bardem (Felipe)Billy Crudup (Steven)Richard Jenkins (Richard) Chiara Brunetti (Claudia)Emma Brunetti (Paola)Lidia Biondi (Ruffina ) (Giulio)Elena Arvigo (Maria)
Estreia no Brasil: 1 de Outubro de 2010
Duração: 133 minutos

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

O Mensageiro do Diabo

Love & Hate

A trama de O Mensageiro do Diabo (EUA, 1955) volta e meia é comparada ao conto da Chapeuzinho Vermelho, o que se mostra uma analogia nada exagerada, afinal, o "reverendo" magnificamente interpretado por Robert Mitchum pode sim ser facilmente visto como a encarnação do lobo mau cuja ânsia, desta vez monetária, leva à perseguição do casal de crianças incumbido de guardar o montante roubado pelo falecido pai.
Dentro deste contexto, o vilão, apesar de casar com a mãe das crianças não possui interesse algum em desfrutar dos prazeres sexuais que o matrimônio lhe permitiria, eis que a cópula seria um ato permitido tão somente para procriação.
Seria, então, aquele serial killer realmente crente na fé divulgada? Seria  a falta de libido por sua esposa motivada em virtude de prováveis tendências pedófilas daquele homem? Seria, por fim, a vitória do amor sobre o ódio uma filosofia de vida levada para além dos nós dos dedos do falso pastor ou seria esse um mero embuste utilizado para conquistar pela fé a confiança de pessoas tão fragilizadas pela crise econômica da Grande Depressão?
O Mensageiro do Diabo não se preocupa, assim, em dar respostas prontas, consolidando, desta feita, uma ambigüidade que expandia, para a época, toda e qualquer ousadia já experimentada pelos filmes noir.  Tanta audácia torna até compreensível a conclusão moral e politicamente correta da produção, isso porque era necessário dar ao público daquele período um sopro de esperança – mesmo que após uma sequência de imoralidades – provando, desse modo, que o amor seria de fato capaz de suplantar o ódio.
Talvez por tripudiar tanto dos dogmas cristãos e/ou por dispor de uma psicologia sexual tão densa e acentuada, a mensagem final não fora suficiente o bastante para cativar o público, tornando o filme um retumbante fracasso comercial responsável por limitar a carreira de Charles Laughton como diretor apenas a esta experiência, o que é uma lástima inconteste, já que mesmo trabalhando com inegável requinte o cineasta obteve a façanha de reservar à sua obra o saudável frescor da rebeldia.

 Dario Façanha (texto originalmente publicado em http://www.setimacritica.blogspot.com)

COTAÇÃO: ۞۞۞۞

Ficha Técnica

Título Original: The Night of the Hunter
Direção: Charles Laughton
Produção: Paul Gregory

Elenco: Robert Mitchum (Harry Powell), Shelley Winters (Willa Harper), Lillian Gish (Rachel Cooper), James Gleason (Birdie Steptoe), Evelyn Varden (Icey Spoon), Peter Graves (Ben Harper), Don Beddoe (Walt Spoon), Billy Chapin (John Harper), Sally Jane Bruce (Pearl Harper), Gloria Castillo (Ruby).

Fotografia:Stanley Cortez

Direção de Arte:Hilyard M. Brown
Figurino:Jerry Bos
Edição:Robert Golden

Música:Walter Schumann

Duração: 93 minutos

Os Dez Mandamentos



s Dez Mandamentos é baseado na história Bíblica de Moisés, O Príncipe do Egito. O Faraó Ramses I manda matar todas as crianças do Egito, quando fica sabendo que uma delas seria a libertadora dos escravos. No entanto, Yochabel (mãe de Moisés) consegue salver seu filho, abandonando-o dentro de uma cesta no Rio Nilo. O bebê é encontrado por Bithiah, filha do faraó, e Moisés acaba sendo criado como um príncipe. Já adulto, Moisés descobre sua verdadeira origem e dedica-se a libertar os escravos do Egito.

Os Dez Mandamentos talvez tenha sido a maior aventura de Cecil B. DeMille - o que não significa que seja seu melhor filme. Mas a visão que o diretor tem de Moisés é curiosa. Diferente do que é encontrado nos filmes bíblicos, o Moisés de Os Dez Mandamentos (Charlton Heston) é um super galã. O começo do envolvimento dele com Nefertiti, personagem de Anne Bexter, é extremamente sensual; o Príncipe do Egito quase não consegue resistir aos seus encantos. Moisés aparece como um homem comum, que possui sonhos, fraquezas e, sobretudo, desejos. E é uma das primeiras vezes que uma orgia é retratada em um filme bíblico - respeitando o assunto e a época, é claro.

Tudo em Os Dez Mandamentos é grandioso. Os figurinos são extremamente detalhados, os cenários são imensos e os figurantes são milhares, além dos efeitos especiais que foram inovadores para a época (principalmente na cena em que Moisés abre o mar ao meio). E as atuações, com todos os olhos voltados para Charlton Heston e não por acaso: Moisés foi uma das melhores atuações da carreira do ator.

Cecil B. DeMille já havia filmado Os Dez Mandamentos em 1923, mas em 1956 ele refilmou a obra usando os recursos do Technicolor. Com a refilmagem o diretor estabeleceu um parâmetro por meio do qual a qualidade das futuras produções bíblicas e épicas seriam medidas.

Os Dez Mandamentos é um retrato de DeMille do mundo nos anos 50, em meio à Guerra Fria. Quando o diretor vai apresentar o filme, fazer uma sinopse é menos importante que enfatizar e implantar a dúvida se "o homem deve ser governado pelas leis de Deus ou pelos caprichos de um ditador como Ramsés". Nesse momento ele, claramente, tem a intenção de comparar o Faraó com o chinês Mao Tse-Tung.

DeMille faz com que as quase 4 horas de filme não passem arrastando; o que é muito mais um mérito seu do que da própria história de Moisés. O diretor usa elementos que na época nunca haviam sido utilizados e até hoje, 50 anos depois, a exuberância de Os Dez Mandamentos ainda não foi completamente superada.



Ficha Técnica:
Os Dez Mandamentos (The Ten Commandments)
Estados Unidos - 1956
Direção: Cecil B. DeMille
Produção: Cecil B. DeMille
Roteiro: Eneas McKenzie, Jesse Lasky Jr., Jack Gariss e Fredric M. Frank, baseado nos livros de J.H. Ingraham, A.E. Southom e Dorothy Clarke Wilson
Trilha Sonora: Elmer Bernstein
Elenco: Charlton Heston, Yul Bryner, Anne Bexter, Edward G. Robinson, Yvone De Carlo, Debra Paget, John Derek, Sir Cedric Hardwicke, Nina Foch, Martha Scott, Judilh Anderson, Vincent Price, John Carradine
Duração: 222 minutos

terça-feira, 12 de outubro de 2010

O Grande Motim



O Grande Motim foi o vencedor do Oscar de 1935 e o único filme da história em que os três atores principais foram indicados ao Oscar nessa categoria; apesar de nenhum deles ter levado a estatueta. O Grande Motim é um dos melhores filmes de aventura marítima já feitos e uma aula de técnica para os filmes recentes; a maior parte da trama se desenrola no mar, e isso nos anos 30.

Charles Laughton é o Capitão William Bligh, o grande vilão do filme e um dos melhores personagens malvados da história. Ele é, praticamente, o responsável pelos maus tratos à tripulação do navio que comanda. Enquanto a tripulação buscava mudas de fruta-pão no Taiti, o Capitão tratava todos com severidade e conseguia o que queria sendo corrupto. William Bligh não perdoava nem os mortos. Para sair da situação de desespero em que se encontravam, a tripulação arma um enorme motim para destituir o Capitão do cargo. A revolução marítima é liderada por Fletcher Christian, interpretado por Clark Gable. Gable reúne todas as características de um herói: tem carisma, boa vontade e um enorme senso de justiça.

Além dos personagens principais muito marcantes, outro aspecto interessante do filme são os personagens coadjuvantes - eles conferem ao filme, em vários momentos, tons de comédia - existe um marujo bêbado, o desespero dos tripulantes quando encontram mulheres e um grande romance. A trilha sonora também não deixa a desejar: Herbert Stothart compôs o típico estilo de músicas de filmes de marujos: aquele tom marcante e imponente.

O Grande Motim reúne grandes atuações e é um belo representante da época de ouro dos filmes de Hollywood. Apesar de todos os pontos positivos, o filme peca em um aspecto: o motim - principal momento do filme que é composto por três atos; a viagem ao Taiti, a estadia e a volta à Inglaterra - demora bastante para ocorrer. A qualquer momento o espectador tem a impressão de que os marujos vão se rebelar. Mas o grande momento só acontece na viagem de retorno à Inglaterra. Assim como é bom para ilustrar a realidade dos marujos, o filme poderia ter alguns minutos a menos se as ações fossem um pouco mais aceleradas. Para aqueles que gostam do gênero capa e espada marítimos, O Grande Motim é um filme necessário.


Ficha Técnica:
O Grande Motim (Mutiny of the Bounty)
Estados Unidos - 1935
Direção: Frank Lloyd
Produção: Irving Thalberg, Frank Lloyd.
Roteiro: Talbot Jennings, Jules Furthman, Carey Wilson
Trilha Sonora: Herbert Stothart
Elenco: Clark Gable, Charles Laughton, Franchot Tone, Dudley Digges, Herbert Mundin, Donald Crisp, Eddie Quillan, Movita, Henry Stephenson, Francis Lister, Spring Byington, Ian Wolfe.
Duração: 132 minutos

Carolina Klautau

sábado, 9 de outubro de 2010

Johnny Vai à Guerra



Perseguido pelo macarthismo, Dalton Trumbo deixou como única obra o filme Johnny Vai à Guerra. Apesar de se passar na Primeira Guerra Mundial, o filme é uma crítica a todas as guerras que aconteceram e que viriam a acontecer. Para narrar a clausura dos soldados, o diretor usa o preto e branco, e para relembrar a vida que eles tinham antes das batalhas, ele usa tons pastéis de colorido.

Johnny, um soldado ferido na Guerra, vai para um hospital e descobre que perdeu braços, pernas, visão e audição. Basicamente, o filme retrata o desespero de uma pessoa que descobre que não pode se ajudar, que depende dos outros para continuar vivo. Vários personagens passam pela vida do soldado, mas ninguém consegue compreender sua dor, para eles, Johnny é apenas mais uma vítima da guerra; ele passa a ser uma pessoa sem passado, sem futuro e sem presente. A única pessoa que se sensibiliza com a situação é uma enfermeira, que passa a ser a voz e os olhos do soldado.

Durante o filme, o que sabemos do desespero de Johnny são suas reflexões; o filme é basicamente todo narrado em off por ele, já que o personagem não pode mais falar. A situação em que ele se encontra é desesperadora. Para mostrar o que pensa, Johnny tenta usar o código morse, já que percebe que os médicos que deveriam tomar conta dele, pensam apenas em como vão se livrar de um "inútil". Nesse momento o diretor debate a eutanásia.

Dalton Trumbo conseguiu passar a aflição de um personagem para os telespectadores, que acabam se sentindo tão impotentes quanto ele. Além do uso das cores, outra escolha sábia do diretor foi optar por não usar cenas de batalhas no filme; o sofrimento do personagem principal é tão forte, que nem sente-se falta das cenas de guerra.

Talvez ao lado de Doutor Fantástico, Johnny Vai à Guerra seja um dos melhores filmes anti-bélicos já feitos. Enquanto um usa o humor para retratar um cenário louco de estratégias, Johnny Vai à Guerra usa o drama e a comoção para fazer com que as pessoas reflitam se batalhas são realmente necessárias e o que acontece com os jovens que precisam enfrentá-las.

O slogan "Johnny Got His Gun", nome original do filme, era o lema do governo para fazer com que os jovens se alistassem. Dalton Trumbo primeiramente escreveu o livro Johnny Vai à Guerra e só então ele foi transformado em filme, que, inicialmente, seria dirigido por Luis Buñuel. Como Trumbo e Buñuel não conseguiram financiamento para a obra, o diretor espanhol abandonou o projeto. Mas Trumbo nunca esqueceu a ideia do filme: ele reescreveu o texto várias vezes e passou muito tempo tentando conseguir alguém para bancar sua obra. A insistência do diretor valeu à pena: é quase impossível manter o mesmo olhar sobre a guerra, depois que assistimos a esse filme.

Johnny Vai à Guerra (Johnny Got His Gun)
Estados Unidos - 1971
Direção: Dalton Trumbo
Roteiro: Dalton Trumbo
Trilha Sonora: Jerry Fielding
Elenco: Timothy Bottoms, Kathy Fields, Marsha Hunt, Jason Robards, Donald Sutherland, Diane Varsi, Milton Barnes, Donald Barry, Craig Bovia, Peter Brocco, Judy Howard Chaikin, Eric Christmas, Kendell Clarke, Maurice Dallimore, Robert Easton
Duração: 111 minutos

Carolina Klautau

sábado, 2 de outubro de 2010

Efeito Tarantino

Não há como negar que Quentin Tarantino seja um dos diretores mais cultuados pela nova geração de cinéfilos. Seus trabalhos são sempre compensadores a quem busca não apenas por diversão e lazer no cinema, mas também para quem já é, digamos, um ‘iniciado’ e deseja novamente adentrar ao ‘mundo tarantiniano’ onde o evento mais improvável ou mais corriqueiro pode surgir de modo surpreendente na próxima cena.

Mike (Kurt Russel) é um dublê de antigos filmes dos anos 70 e nas horas vagas assume o papel de um maníaco sobre rodas nas estradas do Texas e do Tenessee. Suas vítimas são lindas - e tampouco ingênuas - garotas de cidadezinhas. Elas são escolhidas a dedo e perseguidas por ele em seu possante carro à prova de morte. O enredo pode parecer simples, mas Tarantino coloca como motor do filme sua fixação por temas que mostram a equação entre violência e vingança em suas diferentes formas, aqui no caso um carro utilizado como arma mortal. Não poderia faltar a ambientação, a música e o visual que remete aos anos 70 e os produtos de consumo da sociedade norte-americana amplamente difundidos mundo afora pela industria cultural desde aquela década. Tarantino faz uso destes elementos causando um anacronismo estético por assim dizer e isso dá todo um charme à atmosfera de suas produções.
Há citações diretas a grandes roadmovies americanos, principalmente a “Corrida Contra o Destino”(Vanishing Point, 1971) e Tarantino serve-nos a eletrizante e vertiginosa sequência do duelo sobre o asfalto entre a máquina à prova de morte e um Dodge Challenger 1970 com motor de 440 hp conduzido pela vingativa Kim (Tracie Thoms) com Zoë Bell no capô do carro fazendo o “mastro do navio”. É o ponto alto do filme, pois daí em diante os nossos nervos já estão à flor da pele e esquecemos que ficamos minutos atrás entediados com diálogos prolixos de linguagem chula e discussões sem propósitos sobre a sexualidade ou outro assunto qualquer, alternados com a cena do primeiro grupo de mulheres assassinadas com a colisão entre os carros detalhada numa coreografia de imagens com direito a esguichos de sangue e multilação. É uma provocação de Tarantino, que nos transporta num piscar de olhos da mais aparente calma à extrema turbulência. Esta sua habilidade em ‘segurar’ o expectador até o final e compensá-lo com uma emoção quase catártica é tarefa para poucos. Diálogos insólitos e multilações à parte, Tarantino é o que podemos chamar de sedutor da juventude cinéfila e dos novos amantes da sétima arte que embarcam em seus delírios e "sacações' ora divertidíssimos ora violentíssimos. Tarantino traz no currículo ótimos trabalhos como "Jack Brown", "Cães de Aluguel" e o recente "Bastardos Inglórios" e deixa a impressão de que seu "À Prova de Morte" foi uma diversão para ele como diretor e uma obra-prima para seus fãs. Nada contra o culto, mas tudo contra os extremismos! Há também de notar-se os comentários à saída do cinema: "Muito firme!", "Muito louco!" ou "É Tarantino na veia!" É o efeito Tarantino!

“À Prova de Morte” (Death Proof, 2007), é um autêntico Tarantino com todos os indispensáveis ingredientes que fazem de seus filmes uma marca reconhecida a cada fotograma e concede-lhe o status de bom diretor e roteirista legitimado por muitos e questionado por tantos outros.