Um
Filme Cativante
Há quem insista em comparar Intocáveis (França, 2011) com O Escafandro e a Borboleta (França/EUA, 2007);
ocorre, porém, que o primeiro se comporta muito mais como um filme de amizade
do que como um drama sobre um homem paralítico, razão pela qual o trabalho dos
diretores Olivier Nakache e Eric Toledano revela
maior sintonia com títulos como Rain Man
(EUA, 1988) e Perfume de Mulher (EUA,
1992).
Neste passo, ao invés de ser
explorado, o tema da deficiência física serve, na verdade, como pretexto para
introduzir o que realmente interessa: a improvável, mas bem sucedida, relação
amigável e profissional entre dois homens completamente diferentes no que tange
suas raças, culturas e classes sociais.
Ok, o enredo não propõe a invenção
da roda, mas, em se tratando de um material cuja essência já é conhecida de
trabalhos como os anteriormente citados, impressiona como Intocáveis consegue envolver, cativar e ganhar a cumplicidade do
espectador, mérito esse que se deve a uma dupla de protagonistas talentosa o
bastante para fazer funcionar o senso de humor negríssimo que não só pontua a
abordagem de assuntos delicados e sérios como também se mostra responsável pela
humanização de seres habituados a falar o que vem a cabeça por mais
estapafúrdio que isso possa parecer.
No que atine, em específico, o
trabalho dos atores principais, vale dizer que se nas outras produções que
trataram de temas parecidos o destaque em termos de interpretação era conferido
a quem se dedicava ao personagem deficiente², o contrário acontece no fenômeno¹
francês, eis que, mesmo que correto seja o contido tom do trabalho de François Cluzet (um quase clone de
Dustin Hoffman), quem de fato brilha e garante o êxito daquilo que era
pretendido pelo roteiro é a revelação Omar Sy. Esfuziante, falastrão e, não raro,
politicamente incorreto o ex-presidiário interpretado pelo ator deverá, por certo,
persegui-lo pelo resto da carreira, além de entrar para a galeria dos grandes
tipos que compõem o cinema francês.
Otimista e
sensível, Intocáveis possui como grande mérito a
simplicidade, pois, no lugar de pretender funcionar como um tratado sociológico²,
o longa-metragem busca apenas lembrar-nos acerca de algo aparentemente óbvio,
contudo, frequentemente esquecido: ainda que nem sempre seja possível estar no
topo, a vida vale sim a pena. Altos e baixos, oscilações de ritmo – como aquelas
percebidas no próprio filme – são inerentes a nossa existência, daí que havendo
esperança num dia melhor tudo passa a ter um sabor diferente. E é por ser
imbuído desse pensamento que a produção
exala o aroma e o sabor da alegria.
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1. Tomando ainda como exemplo Rain Man e Perfume de Mulher, cabe ressaltar que Dustin Hoffman e Al Pacino
foram laureados com o Oscar de melhor ator por seus respectivos papeis nesses
filmes.
2.“A comédia passou em abril a marca dos
US$ 300 milhões, tornando-se o filme francês mais rentável da história e o
maior sucesso de todos os tempos na bilheteria mundial para um filme em língua
não inglesa. Ainda não acabou, pois seus direitos foram vendidos para mais de
40 países, incluindo os Estados Unidos, onde foram comprados por Harvey
Weinstein. O produtor [...] já está pensando no remake. Colin Firth está cotado
para o papel do aristocrata tetraplégico...” (VALETTE, Phalène de. Revolução
Francesa. in: PREVIEW. Ed. 32. São
Paulo: Sampa, Maio de 2012. p. 10).
3.Neste sentido, Carolina Nogueira
escreve: “Há quem reclame que os personagens não saiam da esfera da caricatura,
que a empatia entre os dois extremos que o filme desperta não resista a um
choque de realidade. Acho que não resiste mesmo - mas isso não diminui a força
(e a diversão) do filme. É cinema, não sociologia. E funciona bem à beça” (FONTE:
http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2011/12/01/intocaveis-419253.asp.
Acesso em 22.08.12).
FICHA
TÉCNICA
Direção: Olivier Nakache, Eric Toledano
Roteiro: Olivier Nakache, Eric Toledano,
baseado no original de Philippe Pozzo Di Borgio
Produção: Nicolas Duval-Adassovsky, Laurent
Zeitoun, Yann Zenou
Elenco: François Cluzet, Omar Sy, Anne Le Ny, Audrey Fleurot, Clotilde Mollet,
Alba Gaïa Kraghede Bellugi, Cyrril Mendy, Christian Ameri
Fotografia: Mathieu Vadepied Trilha Sonora: Ludovico
Einaudi
Estreia no Brasil: 31.08.2012 Estreia Mundial: 02.11.
2011
Duração: 112 min.
Dario Façanha (texto originalmente publicado em http://www.setimacritica.blogspot.com)